sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

2 em 1

1. resposta

toda palavra se faz sobre uma imagem. significado e significante.
toda imagem sobre uma percepção, uma consciência.
memória: cimento da consciência.

2. paisagem da janela do prédio do tédio (ou "verso medíocre de uma manhã de sol")

pinceladas de sol e sombra entre folhas verdes e céus azuis
- severina (qual o nome dela mesmo?) se queixa.
o vento sopra e agradeço o alívio:
logo logo é meio dia.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Sem título

Há habilidades que temos, outras que não. Há faculdades de desenvolvemos, outras que parecem se situar num espaço que está além do alcance dos nossos braços, coração ou inteligência.
Imaginar o seu rosto chorando é uma das habilidades que não tenho - por mais que já tenha visto os teus olhos vermelhos e o teu rosto molhado com lágrimas que não vieram de outros olhos senão dos teus. A habilidade que não tenho, então, não é a da visão. Essa eu tenho, porque sei ter visto tudo o que disse. O que me escapa é essa tua imagem, que até hoje não pude fixar em minha memória. Me escapa teu rosto, tua voz - só percebo um medo obstinado que quando raramente recua é pra voltar logo depois, irritado e decidido como é, como se também não fosse capaz de me ver, de me ouvir.
Tua imagem não chega a mim, minha voz não chega a ti - como se memória e comunicação fizessem parte dessa zona que separa, obstinadamente como certos temores, duas pessoas que se querem tão juntas.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

febre fria

O meu amor não é maior nem menor do que a minha vida.
Um existe no outro e não poderia ser de outro jeito,
e meus planos mais altos e mais sinceros
são os planos da minha vida e os planos dos meus amores.
Meu último poema não seria tão diferente daquele de um autor famoso,
seria, sim, só mais mal escrito.

As amarguras do meu amor, daquele que eu sinto e daquele que eu dou,
são também as amarguras da minha vida, daquela que eu tenho e daquela que eu sonho.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

A minha pequena, a minha grande

Eu queria te dar todo o carinho que eu nem sei se tenho pra dar.

As quimeras nascem não se sabe muito bem de onde, sitiam nossa alma por algum tempo e depois levantam acampamento. Comigo geralmente se dá durante o sono: deito numa cama cheia de angústias e acordo como que de ressaca, sem saber bem onde tudo aquilo foi, o que se passou. Foi como veio - para não se sabe bem onde.

Eu estou tão cansado...

quarta-feira, 10 de abril de 2013

do céu para a terra

a potência maior cujo realizar-se é um eterno vir-a-ser - o amor.
até que ele se torna.

terça-feira, 9 de abril de 2013

perplexidade/intermezzo

Intermezzo.
As mais delicadas e sutis linhas que meu pensamento traça se interrompem quando numa noite banal de início de outono eu me lembro que a mais doce das pessoas está tão desprotegida e frágil quanto todos nós.
Fim do intermezzo.

domingo, 17 de março de 2013

conversa de boteco - domingo de chuva

Durante as conversas e apesar do sono distante, há sempre um sonzinho constante, uma palavra secreta - das que não consentem ser ditas. Mas que conhecemos.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Breve cosmogonia ontogenética

No início tudo era mar. À imagem e semelhança do mundo, grande ovo d'água, surgiu o primeiro e solitário coacervato, represando dentro de si uma pequena fração da imensidão líquida que o rodeava. O início de cada vida que já existiu e existe neste planeta jamais se livrou dessa condição fluida e fundamental: o óvulo fecundado carrega dentro de si, mutatis mutandis, uma parcela daquele imemorial mar primordial. Os dias passam, as células se reproduzem; os anos passam e cada um de nós carrega dentro de si um oceano insondável, cujos sons só conseguimos escutar em nossos sonhos e cujo balanço obedece à cadência ainda não decifrada de nossos corações.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

2001

Não, não me importo com nossa história - quero um amor sem as máculas de um passado e sem as sombras de um futuro. Nunca me julguei um presentista pseudo-apaixonado, idólatra de intensidades que expressam o que me parece certa incapacidade para perceber aquilo que se vive. Um amor que dobra-se sobre si, não em sua total extensão, se é que existe tal coisa; célula solitária que atravessa um universo deslumbrante e inapreensível - desconhece seu passado e não sente qualquer interesse pelo futuro.